Crítica | A Química que Há Entre Nós

Misturando medo, insatisfações, muita confusão e emoções à flor da pele, a adolescência nos empurra e nos puxa para os mais diversos lugares e situações e assim nos mostra como é estar vivo

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Nós podemos encontrar diversas formas de amor na vida. Interessante como a indústria do cinema tem encontrado modos de não deixar tramas sobre o “amor” morrer nos clichês da vida. Na Netflix temos um cardápio cheio de comédias românticas escapistas com romances explorados em sua essência mais pura: o pessimismo romântico. Fato é que muitos filmes na linhagem de  ‘A Culpa É das Estrelas’, por exemplo, são famosos por usarem do sentimentalismo como forma de conquista do público, mas na verdade se trata mais do que isso, é experimentar todas as cores e suas nuances num sentimento tão bonito como o amor que vivenciamos em algum momento da vida e não apenas o amor, mas a dor, a perda, a falta de esperança… enfim, a sensação de estar vivo. No melancólico ‘A Química que Há Entre Nós’ (Chemical Hearts), original do Amazon Prime Video e que mostra de forma vivida a construção de relações através do luto, da saudade e da solidão.

O longa dirigido por Richard Tanne (Southside With You), é uma adaptação do livro best-seller ‘A Química que há Entre Nós’, da autora Krystal Sutherland, embora seja simples e não se distancie de outros clichês do gênero como ‘A Cinco Passos de Você’, o filme tem suas peculiaridades e seus detalhes mais profundos encantam o telespectador. Remendo… acredito que essa seja a palavra que defina essa relação existente entre os adolescentes, Grace Town e Henry Page. É um remendo de suas dores, de suas almas, algo de misterioso nela, chama muito a atenção de Henry e apesar de doce e honesta, o drama expõe todas as feridas que não cicatrizaram. A personagem de Lili Reinhart (Riverdale) é tão bem construída que sentimos a dor que ela sente. Ela atua de uma forma tão real que se torna impossível não se deleitar diante de uma história que nos mostra como é importante ter empatia pela dor do outro.

Já Austin Abrams (Euphoria), tem um ar tristonho em seus olhinhos, além da doçura de suas atitudes, tem uma química estonteante com Reinhart… muito dessa química já vi em filmes como ‘Um amor para recordar’ e o tom fúnebre do cinema de Gus Van Sant, especialmente em ‘Inquietos’ (que é maravilhoso, triste e doce ao mesmo tempo). A dupla entrega um casal equilibrado, real, com falhas e defeitos, com conversas que exprimem a reflexão e nada disso se compara com um amor pela metade ou com o tão idealizado “amor perfeito” que não existe e sim com a virtude de se encontrar o amor e de viver esse sentimento tão perturbador e ao mesmo tempo tão maravilhoso.

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Austin Abrams e Lili Reinhart são Henry Page e Grace Town em “A Química que Há Entre Nós”/ Amazon Prime Video

Algo muito interessante é a técnica japonesa de remendar porcelanas quebradas com ouro, algo que dá outro significa a peça, o roteiro faz uma deliciosa metáfora sobre relacionamentos líquidos, sobre consertar ao invés de jogar fora, como as pessoas que passam em nossas vidas deixam marcas imensuráveis delas em nossas vidas e como o luto precisa de tempo para ser superado. A trajetória de ambos é cercada de ensinamentos e reflexões pontuais que o gênero parece ter medo de mostrar que gera impacto no desfecho agridoce.

Já percebemos o quão raso é a abordagem do amadurecimento amoroso nos cinemas e, apesar de realista e triste, abre um debate muito interessante com o público, já que desconstrói a idealização do amor eterno e explora as idas e vindas das pessoas em nossas vidas, fato inegável. Algo rico que o roteiro costura é a forma como ele aborda o sentimento de dor, de saudade, de amor e torna esses sentimentos abstratos em coisas palpáveis usando das explicações de reações químicas causadas por esses sentimentos em nossas mentes e em nossos corpos. Inacreditável, mas quando foi que paramos para prestar atenção que nossos sentimentos se tratam de reações químicas causadas por substancias como ‘dopamina’ ou ‘ acetilcolina”? Isso mostra que o amor e qualquer outra emoção se tratam de reações químicas que nos lembram o quão brilhante é a maquina humana que sente, que demonstra e que supera.

A fotografia, a narração e a trilha sonora são atributos a parte e vemos um “universo” melancólico e triste com seus tons esverdeados que nos dão a sensação de calma em certos momentos. Já a trilha sonora, com baladinhas, envolve a quem assiste nesse universo sensorial por uma hora e meia. É um mergulho profundo. A direção explora alguns planos diferentes e a montagem também tem liberdade de testar sensações diversas, como duplicar e repetir o mesmo plano, assim que o casal dá o primeiro beijo. O ritmo conduz uma narrativa que não se apressa e que não cansa, embora o final seja mais rápido.

Já estava na hora de mostrar o amor como ele é, um sentimento que causa desordem por onde passa e o saldo positivo é que tratar de relações que se constroem na base do conserto, do remendo, mostram que podemos ser solidários ao próximo, ser empáticos e generosos… afinal, o amor é uma troca, é receber e dar sem medo. E não tem nada mais gostoso que assistir um filme que não mostre amores irreais ou que se sustente com barracas montadas na escola. O amor é mais que isso… é uma reação química que alivia, que diverte, que gera dor, mas nos mostra como estamos vivos e como é bom se sentir assim.  

Resumo
Nota do Thunder Wave
critica-a-quimica-que-ha-entre-nosA Química que Há Entre Nós é uma produção que mostra de cara limpa a realidade de um amor construído na base do "conserto"... é entender o outro mesmo quando não conseguimos nos entender, é apoiar e caminhar juntos e nesse longa, a superação de situações que nos tiram o chão, podem levar mais tempo do que parece, mas é isso. É se reconstruir das cinzas.

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