Crítica | Alemão 2: Sete Anos Depois, o Retorno ao Complexo

Alemão 2 tem suas inconsistências, é inegável, mas cumpre grande parte do seu papel que se propõe, com uma abordagem política e sua crítica social viscerais e diretas.

Uma evidência sólida da maturidade que vem sendo atingida pelo cinema nacional são as suas sequências. Quando um filme recebe uma sequência, significa que ele foi bem sucedido o bastamte para que seja considerado seguro investir na sua continuação. E este foi o caso de Alemão, filme de 2014, dirigido por José Eduardo Belmonte que retratou a violência nas favelas pacificadas do Rio de Janeiro.

Apesar de planejada já ao final das gravações do primeiro longa, sete anos se passaram até a conclusão da continuação, que tem o retorno de Belmonte à direção, produção de Rodrigo Teixeira, da RT Features em colaboração com a Buena Vista International e o Canal Brasil, além de roteiro de Thiago Brito e Marton Olympio.

Alemão 2 se passa nove anos após os acontecimentos do primeiro filme. Nele conhecemos o policial civil Machado (Vladmir Brichta), que lidera uma complexa ação secreta no complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Sua equipe, que também conta com Ciro (Gabriel Leone) e Freitas (Leandra Leal), além de ser comandada pela delegada Amanda, precisa entrar à paisana no complexo em busca de um líder local do tráfico, seguindo pistas cedidas por um informante. Porém, a missão falha e a equipe fica presa dentro do conselho em meio a uma guerra de quadrilhas, ao mesmo tempo em que são caçados por traficantes.

Apesar de o filme possuir um claro (por vezes até explícito) componente político, algo que o diretor Eduardo Belmonte fez questão de apontar, em coletiva de imprensa, ser intencional, Alemão 2 é principalmente um filme de ação e drama policial, sendo voltado ao público geral.

O produtor Rodrigo Teixeira, também presente à coletiva, cita o quão importante é que esse filme seja feito visando esse público neste momento de retomada após os piores momentos da pandemia que chegou após 2019 ter sido um dos melhores da história do cinema nacional. O filme será disponibilizado em 300 salas na sua estreia oficial em 31 de março, mas já conta com 67 salas em 22 cidades desde a pré-estreia, em 24 de março.

O diretor José Eduardo Belmonte mostra evolução no seu trabalho, ao mesmo tempo em que traz uma visão mais madura sobre os temas que traz ao longa, embora eles não cheguem a ser realmente aprofundados no filme, talvez na sua tentativa de priorizar a ação.

Esta possui bons momentos, principalmente na criação de tensão quando se foca na equipe de Machado tenta sobreviver ao cerco dos traficantes, bem como na situação dos moradores do Complexo do Alemão, mas também encontra alguma inconsistência em outros momentos, particularmente nos tiroteios. Ela é, definitivamente, muito realista, algo que talvez não agrade ao espectador de um “Tropa de Elite”, por exemplo, que provavelmente é o principal público-alvo buscado.

O filme acerta mais na caracterização dos personagens. Seu retrato, tanto dos traficantes quanto dos policiais, além dos habitantes das comunidades carentes, é bastante realista, sem cair em maniqueísmos, com personagens humanizados em todos os lados, sujeitos a erros e a atitudes condenáveis, mas sem em nenhum momento deixando de serem críveis.

Isso se torna bastante evidente sendo trabalhado no personagem Soldado, interpretado por Digão Ribeiro, chefe do tráfico capturado pela equipe de Machado, que é indiscutivelmente um criminoso, mas que também possui grande amor pela sua família; mais ainda descobrimos que um dos seus sonhos de infância era ser soldado. Não existe preto no branco no longa, e o filme trabalha bem todas essas tonalidades de cinza.

A violência policial é outro dos temas vitais ao filme. Vemos tanto aspectos da polícia corrupta, que trabalha junto a traficantes em nome do próprio lucro, quanto da polícia despreparada, que é capaz de atirar sem pensar, vitimando inocentes que estão ao redor, ambos com uma crueza e realidade que podem ser chocantes, mas que são reais. Como o ator Digão Ribeiro, intérprete de Soldado, citou durante a coletiva de imprensa de lançamento do filme: “o longa fala que tem gente que continua morrendo nas comunidades, tratar a mensagem como algo além disso vai se perder”. O diretor Belmonte cita que essa foi uma preocupação da equipe, de mostrar o que está ao redor, contrastando com o primeiro filme.

Durante a coletiva de imprensa, a equipe fez questão de falar sobre a importância do caráter político do filme, e da necessidade de posicionamento da classe artística, em um momento em que a cultura no país sofre com ataques e desmanches. Porém esse não foi o único aspecto abordado. A necessidadade da reinvenção de formas de alcançar o público, a mudança das fontes de financiamento e a revolução trazida pelo streaming também foram abordados por toda a equipe.

O elenco é competente, mas com exceção dos personagens principais, ele não é explorado como poderia. Vladimir Brichta, Leandra Leal, Aline Borges, Digão Ferreira, Zezé Motta e Mariana Nunes (a única que retorna do primeiro filme, reprisando o papel de Mariana) estão muito bem, contudo. A equipe responsável pela escolha do elenco trabalhou de forma sutil (mas eficiente) a questão da diversidade. Encontramos homens e mulheres, brancos e negros, em diferentes posições ao longo do longa, embora a maior parte da população do complexo seja (acertadamente) representada como negra, enquanto os policiais são majoritariamente brancos.

Alemão 2 tem suas inconsistências, é inegável, mas cumpre grande parte do seu papel que se propõe a cumprir. Sua abordagem política e sua crítica social são viscerais e diretas, sem deixar espaço para interpretações dúbias. Seu retrato da situação vivida no cotidiano pelos habitantes de tantas comunidades ao longo do país também é honesto e preciso, embora as dinâmicas de poder (tanto do crime organizado quanto da polícia) poderiam ser melhor exploradas.

Sua humanização dos personagens é eficiente, mostrando como muitas vezes não há mocinhos nessa história. Como filme de ação, ele peca um pouco no aspecto principal (a ação em si), mas consegue criar boas cenas (realistas e cruas), além de passar tensão na medida certa. No fim das contas, tem mais acertos do que erros e merece ser conferido.

Por: Wallace William

Nota do Thunder Wave
Alemão 2 tem suas inconsistências, é inegável, mas cumpre grande parte do seu papel que se propõe, com uma abordagem política e sua crítica social viscerais e diretas.
Escrito PorWallace William

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