Gênios e suas lâmpadas mágicas são bem conhecidos como parte das lendas, crenças e folclore do oriente médio. Contudo, desde a popularização dos contos das Mil e Uma Noites, também se tornaram um tema comum no ocidente, inclusive sendo frequentemente retratados nos cinemas. O mundo mágico e as infinitas possibilidades dos seres que poderiam realizar quaisquer desejos nos são, portanto, bastante familiares. Em uma época em que diversos mitos e lendas são revisitados pela ficção e recebem abordagens “atualizadas”, não demoraria para que logo os gênios também passassem por tal tipo de releitura. E é exatamente o que acontece em Era Uma Vez Um Gênio, dirigido por George Miller (conhecido principalmente pelo seu trabalho na franquia Mad Max), e estrelado por ninguém menos do que Idris Elba e Tilda Swinton.
No longa, a narratologista Alithea Binnie (Tilda Swinton) nos conta a sua história, e de antemão nos avisa que irá fazê-lo na forma de uma fábula, ou seja, ela pode não ser totalmente verdadeira. Em um viagem para um congresso em Istambul, ela começa a ver seres que parecem saídos diretamente dos mitos e lendas que ela tanto estudou. Ela chega a desmaiar em das suas palestras após ter uma dessas visões, mas acredita que não é nada. Ao visitar o Grande Bazar de Istambul, ela adquire uma estranha garrafa que, ao ser aberta, liberta um Djinn (Idris Elba).

Como é praxe nas histórias, ele anuncia que concederá três desejos a ela para ser libertado. Alithea, porém, não parece dispsta a formular os pedidos, pois conhece muito bem as lendas sobre gênios e sabe que elas raramente possuem um final feliz. Assim, o Djinn começa a contar as várias histórias sobre as vezes em que foi aprisionado, desde os tempos da Rainha de Sabá e do Rei Salomão, passando pelo sultão Suleimane, até chegar aos dias atuais. Tornando-se uma espécie de versão atual e sobrenatural de Sheherazade, o encantamento de suas narrativas começa a derrubar aos poucos o ceticismo de Alithea, bem como sentimentos que ela vinha reprimindo.
E esta é a principal magia do filme: demonstrar o poder das histórias para encantar e transformar até mesmo uma mente cética que acredita conhecer tudo. As lendas contadas pelo gênio contam com a estrutura clássica das fábulas, atravessando diversas épocas e contextos e abordando diferentes sentimentos e ensinamentos, mas sem finais felizes, pois sempre terminam com o Djinn aprisionado. E conforme as escuta, Alithea vai permitindo que as barreiras que criou ao seu redor caiam, desenvolvendo sentimentos pelo gênio. Mas, como é comum às grandes histórias de amor da ficção, esta é uma relação condenada, pois os mundos de Alithea e do gênio se mostram incompatíveis.
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A direção de Miller é primorosa. A parte visual se destaca acima de tudo, trazendouma imersão poderosa, fantasiosa e onírica, algo bem diferente do seu trabalho em Mad Max, pelo qual o diretor é principalmente lembrado. Há um cuidado imenso em trazer uma poderosa experiência sensorial ao expectador, não apenas visualmente, mas também na sugestão de outros sentidos, sempre ligando-os às narrativas trazidas pelo gênio. Cada narrativa cresce em Alithea, mostrando a ela um poder oculto nas histórias que tanto julgava conhecer.

O elenco é, como havia de se esperar, fabuloso. Afinal, estamos falando de Idris Elba e Tilda Swinton, mas mesmo conhecendo a capacidade dos dois astros, é impressionante o quanto Miller conseguiu retirar de ambos, como a sabedoria, melancolia, sensualidade e desejo do Djinn em sua busca pela liberdade, ou o ceticismo, a racionalidade e a firmeza de Alithea, que gradualmente desmoronam perante os contos do gênio, mostrando o quanto de insegurança se escondia por traz da sua fachada racional. A dicotomia entre a magia do Djinn e o racionalidade da pesquisadora (mesmo que uma pesquisadora que vive imersa em um mundo de lendas) é uma grande força motriz para a história.
Era Uma Vez Um Gênio estreia no dia 1º de Setembro e merece muito ser conferido, não apenas pela narrativa bem construída e original (baseada no conto The Djinn in the Nightingale’s Eve, de A.S. Byatt), mas também pelo deslumbre visual e por toda a magia que sua experiência passa ao expectador.