Mais uma história chega ao fim e por mais dolorido que possa ser para alguns, a série terminou bem. Podemos dizer que tudo ou quase tudo que esperávamos ver na terceira temporada foi entregue. O roteirista David Farr e a diretora Anca Miruna Lazarescu fizeram um bom trabalho, cujo resultado podemos ver através da atuação delicada e madura da jovem britânica de 21 anos, Esmé Creed-Miles. Nos momentos finais de Hanna, é no silêncio e na observação de sua protagonista que vemos o alívio de uma dura e difícil jornada que a ajudou a amadurecer, mas que deixou muitas cicatrizes e arrependimentos adquiridos ao longo do caminho. A terceira e última temporada de seis episódios no Amazon Prime Video que chegou no último dia 24 de novembro, encerrou-se com chave de ouro.
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Antes de tecer os elogios a toda pós-produção e atuação, devo ressaltar os pontos negativos que poderiam ter sido evitados neste desfecho eletrizante. Desde o início, sabíamos que Hanna, série que adapta o longa-metragem homônimo de 2011, não tinha muito para ser inventiva em termos de narrativa e, talvez, por isso, seja uma ótima ideia o encerramento agora nesta terceira temporada. Inicialmente, causou espanto saber que a sequência teria apenas 06 episódios diferente das anteriores que contemplam 08 cada uma. Devido aos erros que se arrastaram desde a primeira temporada e que não foram sanados e sim amenizados, esta última e terceira temporada finaliza uma produção com qualidade já que mais continuações poderiam perder o foco e fazer com que o “todo” fosse comprometido.
Agora, de forma mais profunda, Farr se mostra mais conciso na narrativa que mergulha um pouco mais no “mistério Utrax”, porém com a introdução do talentoso e assustador Ray Liotta como Gordon Evan/ Diretor – o poderoso chefão da organização Utrax e o pai abusivo de Marissa Wiegler, interpretada pela Mireille Enos, o que cria uma dinâmica estranhamente interessante na trama e de forma contrária é uma boa subtrama paralela ao drama vivido por Hanna, com Esme Creed-Miles tendo sua melhor performance de toda a saga. Algo que podemos dizer que se tornou clichê durante toda a saga, são as reviravoltas “preguiçosas”, pois saber que o líder secreto da Utrax, o Diretor, é o pai de Marissa não é uma das mais interessantes e inteligentes ideias que o roteiro desenvolve, mas funciona como parte da engrenagem dando gás para que a história termine de forma satisfatória.

A meta da temporada final é a volta de Hanna, com a ajuda duvidosa de John Carmichael, à Utrax, com o objetivo de destruir a organização por dentro, atrapalhando os assassinatos dos possíveis jovens subversivos que estão numa lista gerada a partir de dados expostos e capturados na internet por analistas da organização. Sem tempo para perder, as cadetes são mandadas para suas missões homicidas em vários países onde deverão executar suas missões e Hanna junto com Marissa tentam impedir as mortes. Aqui a ajuda de John Carmichael é algo que vemos muito em cima do muro, ele é jogado de um lado para o outro de forma que fica nítido que ele não é bom e age por próprio instinto de sobrevivência, mas o roteiro poderia ter aproveitado melhor esse personagem que tem um background que poderia ter sido usado de forma mais astuta. Porém, o destaque vai para a performance da personagem Terri Miller (Cherrelle Skeete), que acorda no momento certo e também tenta ajudar nessa empreitada ambiciosa que Hanna e Marissa tentam obter sucesso.
A cagada maior começa quando o roteiro decide que Hanna precisa se apaixonar por seu alvo – aconteceu de forma instantânea, como se fosse pastel-, Abbas Nazir (Adam Bessa) ao ponto de não só salvá-lo, como também visitá-lo estupidamente em seu esconderijo, dando chance para que a Utrax voltasse sua atenção para a garota que dava sinais de ser um problema. Essas facilidades do roteiro em parte criam níveis de complexidade às operações da organização, mas não desenvolve, não dá forma e percebemos que o roteiro só joga e deixa no superficial. Outra coisa que não deveria ser clichê são os momentos de tensão. Se prestarmos atenção desde o início da saga, todos os momentos de aflição e perigo envolvendo Hanna são resolvidos com objetos simplórios como um garfo de plástico ou um prendedor de cabelo. Isso faz com que o roteiro fique preguiçoso, pois toda vez que uma complicação surge, ele resolve dá um jeitinho e como mágica está tudo resolvido.
No entanto, nem tudo é negativo. Apesar dos erros que foram repetidos ao longo das três temporadas, essa última sequência é dinâmica o suficiente para que possamos nos desvencilhar dos tropeços e focar nas cenas de ação que estão bem coreografadas e bem feitas. Algo que ajuda é o fato de ter apenas 06 episódios de duração padrão, além claro, de o objetivo de Hanna e Marissa não ser mais a investigação e, sim, acabar com toda a organização secreta que tem uma base em Berlim. Agora, a trama lida de forma honesta com o espectador fazendo com que desperte a vontade de assistir até o final – menos quando os dramas dramáticos caem de paraquedas como a forçada paixonite entre Hanna e Abbas e a conturbada e bizarra relação de pai e filha, Marissa e Gordon, aparecem para atormentar o telespectador. Contudo, algo que anuncia o fim de verdade é a volta de Hanna ao seu habitat “inicial”, ou seja, numa floresta na Alemanha que nos lembra aos episódios iniciais da primeira temporada, onde foi criada por Erik e de onde era esperado não ter saído.

Pelas entrelinhas, identificamos o carinho de Farr por Hanna, a personagem e a série, é óbvio e compreensível. Foi ele quem criou esse universo ficcional há mais de uma década, quando escreveu a primeira versão do que viria a se tornar o longa-metragem Hanna em 2011, dirigido por Joe Wright como uma mistura de conto de fadas com muita ação. Ao renascer num produto para TV, Far conseguiu contar a história que Hanna tinha que ter: uma agente badass muito estilosa no seu exterior, mas com um íntimo inundado por sofrimento e cheio de dúvidas sobre como é ser humana no século XXI. Apesar da pouca idade, Hanna amadureceu e mostrou para o que veio.
Aqui o suspense morno é posto de lado e a brutalidade eficiente das cenas eletrizantes de ação reina com destaque e proeza. Na Europa, a paisagem e os locais turísticos dão lugar a uma Europa pouco popular. Tudo aqui é deserto ou frio demais, como se esse ambiente fosse inóspito para a vivência de seres humanos. Aqui a trinca de diretoras, Anca Lazarescu, Sacha Polak e Weronika Tofilska, imagina e recriam o universo de Hanna de uma forma diferente, dando espaço para algo mais intrínseco e característico da personagem como a sensibilidade observadora, quase poética, mesmo em meio à violência que por vezes explode na tela. Aqui percebemos que a meta é retratar Hanna como uma pessoa que sofre os efeitos de uma existência pautada pela violência em um sistema de poder e de afeto artificiais e como cada personagem interage e reflete esse impacto na narrativa.
Ponto positivo para a trilha sonora que soube não ser previsível e muito interessante. Os efeitos especiais estão de acordo com o que foi oferecido em tela desde o começo. As atuações de Esmé e Mireille são incríveis, elas conseguiram transformar a relação de ódio do início em algo mais profundo e até verdadeiro nesta terceira e última temporada. Ray Liotta fez um excelente trabalho – ele consegue ser super assustador-, com um timing perfeito. E, felizmente, com dois episódios a menos do que o padrão, David Farr faz exatamente o que se propôs, encerrando uma narrativa de forma satisfatória. A trama pode ter demorado para nascer, mas seu final surpreendente não chegou nem um minuto atrasado.
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Olá,
Eu tenho olhado essa série na Amazon e estava com curiosidade sobre ela, mas ainda não havia procurado saber nada sobre. Gostei de conhecer a série através do seu post, mesmo com os altos e baixos.
Beijo!
http://www.amorpelaspaginas.com