As idas ao teatro foram substituídas por palcos vazios e peças canceladas com a pandemia de COVID-19 e foi o que aconteceu com a Cia. BR 116 que para comemorar seus 10 anos em 2020 se preparava para a montagem de “Medeia”, assinada por Consuelo de Castro, uma das maiores dramaturgas brasileiras.
Ainda assim, não desistiram de apresentar ao público essa peça e com uma boa dose adaptação à nova realidade e conseguiram trazer para o público de casa não a sensação de estar sentado em uma cadeira na plateia, mas sim de estar vendo o desenrolar dos acontecimentos de dentro do palco, ao lado de cada um dos personagens. Apesar de terem uma equipe reduzida, conseguiram unir a encenação teatral e transmitir nessa filmagem única, nesse teatrofilme, como o grupo chama o projeto.

Mesmo com uma equipe reduzida a qualidade que entregam é espetacular. A combinação dos takes e o foco nas expressões dos atores trazem um toque especial, a escolha por ser em preto e branco também ajuda na ambientação, as cenas são minimalistas, para justamente trazer o foco para os atores e sua interpretação. As lágrimas, as expressões, os sons que acompanham as cenas, são esses detalhes que elevam ainda mais a qualidade.
A versão de Consuelo de Medeia traz um certo contorno político que não é visto na peça original, Medeia é não só uma feiticeira, mas também é uma transgressora que busca democracia e o direito das mulheres, que promove esse levante, que lidera, deixa de ser apenas a mulher apaixonada por Jasão, e toma uma proporção maior. O embate político de Jasão com Creonte, a loucura de Glauce e as motivações para cada um dos personagens vai se desenrolando em uma dança de intrigas e planos.
Assim como as antigas tragédias o que não pode ser alterado no destino, as profecias que são proferidas e que sempre irão se realizar, de alguma maneira. Esse final imutável ganha ainda mais brilho com o final que temos em Medeia, que apesar de todo o infortúnio ainda se ergue e segue em frente.

É um teatrofilme cheio de sentimento e emoções, estão todas estampadas nas caras dos atores e chegam a ser viscerais. Bete Coelho, quem interpreta Medeia e dirige em conjunto com Gabriel Fernandes diz que: “Podemos ver na tela o cansaço, as olheiras que fizemos questão de não esconder. O desmedido. O acaso e o descaso. O suor lembrando que é teatro. Vemos uma trupe de atores se apropriar de uma tragédia que ainda é nossa: o poder infame e corrupto. Vemos uma mulher – com sua capacidade política, transgressora e intuitiva – sendo esmagada. Vemos, afinal, o início e fim de toda tragédia. Ações humanas sob o signo do sofrimento”.
Além de Bete Coelho como Medeia, o teatrofilme conta com Flávio Rochaa como Jasão, Roberto Audio como Creonte e Luiza Curvo como Glauce.
Essa experiência chega dia 09 de abril aos Super Lançamentos do Belas Artes à la Carte.