Ivana Negrão, Carol Moreira e Mabê Bonafé falam sobre machismo estrutural e true crime

Na última terça-feira, 14, participamos de um bate-papo com a jornalista da ESPN Ivana Negrão e as produtoras de conteúdo e podcasters do Modus Operandi, Carol Moreira e Mabê Bonafé. Foi uma conversa rica e muito importante. Estamos no lançamento da nova produção da Star+, O Estrangulador de Boston. No suspense ambientado na década de 1960, Keira Knightley vive Loretta McLaughlin, uma jornalista que investiga um assassino em série envolvendo mulheres vitimas de violência sexual e mortas em seguida.

O Estrangulador de Boston é um notório assassino em série que atuou na área de Boston, Massachusetts, durante o início dos anos 1960. O assassino foi responsável pelo assassinato de pelo menos 13 mulheres, e possivelmente até 19. Sua identidade foi objeto de muita especulação e controvérsia, com vários suspeitos sendo nomeados ao longo dos anos, até chegar a uma conclusão tardia. Leia sobre Dossiê | Albert DeSalvo- O Estrangulador de Boston

A presença das profissionais foi muito interessante, pois pudemos discutir temas importantíssimos como o machismo estrutural, o sexismo, a descredibilização da mulher no ambiente de trabalho, a falta de apoio que muitas vezes dificulta a rotina de mulheres que buscam por mais liberdade não só sobre suas escolhas pessoais, mas também profissionais. Além de tudo isso, falou-se também da popularização do gênero true crime, já que o longa apresentado faz parte do gênero.

O passado nunca esteve tão presente nas narrativas

Infelizmente, os acontecimentos retratados no longa, que estreia no dia 17 de março na Star+, não são tão distantes assim. O que mais vemos nos noticiários é a quantidade de casos de violência contra a mulher acontecendo a todo momento. Essa semana, por exemplo, tivemos um episódio de importunação sexual na atual edição do Big Brother Brasil que culminou na expulsão de dois participantes. O machismo estrutural e a masculinidade tóxica são assuntos que têm ganhado palco nos últimos anos, sendo preciso debater sobre esses assuntos até que a sociedade faça algo e não deixe que os abusadores saiam em pune. 

#IMPORTUNAÇÃO SEXUAL É CRIME! 

De acordo com a publicação do Meio&Mensagem, uma onda de manifestações de praticamente todos os patrocinadores do Big Brother Brasil inundou as redes sociais na semana passada. Após a exibição de cenas de festa realizada no programa, em que o cantor MC Guimê e o lutador Antonio Cara de Sapato tiveram comportamentos abusivos com Dania Mendez, participante mexicana convidada a visitar os colegas da edição brasileira, o público pediu providências da Globo e cobrou atitude dos patrocinadores. O movimento foi iniciado pelo Mercado Livre e seguido por outras marcas presentes no reality, como Ademicon, Riachuelo, Coca-Cola, Nestlé, Pantene, Downy, TikTok, Amstel, Seara, Chevrolet, Zé Delivery, Carrefour, Vick, Always, Stone, Rexona, Hypera Pharma e Pague Menos. De modo geral, todas diziam que qualquer situação de assédio ou abordagem sem consentimento não poderia ser tolerada e pediam respeito às mulheres. Na noite de quinta-feira, 16, a Globo exibiu as cenas da festa e anunciou a eliminação dos dois participantes envolvidos no episódio. Esta edição do BBB é a temporada com a maior participação de marcas: são 35 os anunciantes presentes na atração, o que rendeu à Globo faturamento comercial recorde.

Os fatos retratados no longa dirigido por Matt Ruskin abordam a história real do serial killer que aterrorizou a população de Boston na década de 1960, sendo preciso que duas jornalistas se sensibilizassem para que a polícia fizesse algo. O filme não escancarou apenas a violência de gênero, mas uma série de outros problemas estruturais da sociedade como o sexismo nas redações jornalísticas, as relações familiares e a forma como as mulheres que quebram os padrões são vistas. Embora se passe na década de 60, sua temática é muito importante, pois revela que apesar de estarmos em 2023, com tantas leis e medidas protetivas, os homens não deixaram de matar as mulheres.

As mulheres e as barreiras que precisam escalar

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Ivana Negrão jornalista da ESPN / Reprodução

A jornalista Ivana Negrão contou um pouco da sua trajetória, marcada não só pelas conquistas, mas pelos obstáculos que precisou vencer para ser enxergada na sua profissão. Formada em Jornalismo e pós-graduada em Jornalismo Econômico. Começou a carreira na TV Tropical, afiliada da Rede Record em Natal, como repórter e apresentadora de hard news e do programa automotivo “Motores & Ação”. Migrou de vez para o esporte quando trabalhou na Band Natal, onde apresentou o Jogo Aberto local por 3 anos. Também foi repórter de rádio em jogos de futebol antes de se mudar para São Paulo.

Na capital paulista, o histórico de nadadora a levou para os Canais ESPN. Comandou o programa Planeta Água e se tornou setorista de esportes aquáticos na TV e no rádio. Ainda nos Canais Disney, trabalhou como produtora e editora nos mais diversos programas da casa até retornar ao vídeo como comentarista. Muitas vezes ela se pegou vivendo situações que nenhuma mulher gostaria de viver. 

Fui influenciada pela minha mãe. Meu pai não entende nada de futebol. E por causa disso, eu sempre me senti muito à vontade em ambientes que as pessoas estranhavam a presença feminina porque em casa eu nunca tive essa referência de que tinha ambiente para homens e para mulheres, apesar de ser filha de um militar.

Ao comentar sobre o filme, Ivana conta que se sentiu impactada, pois assim como a protagonista que precisa se desdobrar para cuidar dos filhos e ainda ser uma jornalista competente, ela fala da dificuldade que é não se encaixar nos padrões pré determinados pela sociedade. Além de falar sobre o machismo presente no comportamento dos homens, ela cita o machismo que está em muitas mulheres também que muitas vezes não apoiam as suas semelhantes.

Carol Moreira pontuou algo muito interessante acerca da protagonista que vive um dilema entre a carreira profissional e o seu papel de mãe, esposa e dona de casa. Vemos claramente que a protagonista não estava conseguindo lidar e ter que fazer essa escolha é difícil, entre o que ela quer e o que a sociedade exige é um custo alto para ser pago.

Leia também: Crítica | O Estrangulador de Boston (2023)

Mabê Pereira ressalta a importância de toda a investigação sobre o modus operandi do autor dos crimes feito pir uma mulher que teve o interesse de analisar, de apurar de forma profunda como as vítimas foram selecionadas, se conheciam ou não seu ceifador, etc.

Ela se importa porque ela é uma mulher. Ela é uma possível vítima.

Carol Moreira.

Ivana ainda reforça que trabalhar num ambiente diverso é super importante, pois detalhes que podem ser despercebidos por uns, podem ser percebidos por outros devido às vivências e as perspectivas diferentes existentes em cada ser humano. Assim como Ivana, Carol também já foi descredibilizada por homens no ambiente de trabalho. Embora sejam situações que acontecem sempre e deixam marcas cruéis, ambas falam que foram coisas que as fizeram buscar cada vez mais pelo o que acreditavam e o fato de terem outras mulheres que as acolhesse foi algo importante.

O true crime e o interesse do público em desvendar crimes perversos

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Carol Moreira e Mabê Bonafé / Reprodução

Foi publicado recentemente que as mulheres são produtoras e maiores consumidoras de true crime no Brasil, isso porque o desejo de compreender as motivações de um criminoso, para evitar ser vítima, pode motivar interesse do público feminino pela temática. O gênero virou febre no mundo inteiro e tem conquistado cada vez mais o gosto feminino que não são apenas espectadoras, mas produtoras dos mais diversos formatos como podcasts, livros e até séries de TV.

Uma produção bem famosa é o Modus Operandi, do catálogo da Globoplay, por exemplo, que foi o podcast mais ouvido de 2020, na categoria crime e suspense. O podcast é conduzido por Carol Moreira e Mabê Bonafé e mais de 70% de sua audiência é composta por mulheres, seguindo uma tendência já observada pelas plataformas de streaming.

“As pessoas se interessam por true crime por diversos motivos, só que o que a gente identifica bastante é a curiosidade de entender como aquela história se desenhou, como o crime foi praticado, quem são as pessoas por trás, tanto as vítimas como quem comete os crimes. Em relação às mulheres, tem o fator proteção. Muitas consomem esse tipo de conteúdo para entender como evitar situações que possam colocá-las em perigo”, avalia Mabê.

O programa é conhecido por explorar o processo, o desenvolvimento dos crimes, desde a ideia inicial, a premeditação, execução e a camuflagem para não ser pego. Com um pouco mais de episódios lançados, o Modus Operandi explora casos conhecidos na mídia brasileira, como o de Suzane von Richthofen, até outros mundialmente famosos, como o assassinato de Maurizio, herdeiro da Gucci, intercalados com episódios sobre curiosidades. Um exemplo é o episódio Exodus: a cruel terapia de conversão LGBTQIAP+, que se aprofunda na investigação do grupo de religiosos responsáveis por promover, durante décadas, terapia de reorientação sexual.

Algo muito legal é que através desse projeto, as apresentadoras buscam desconstruir os argumentos que validam tais crimes, como “ela usava uma roupa curta demais” para culpabilizar as vítimas. Segundo a dupla de podcasters, os feedbacks têm sido positivos e vêm principalmente de mulheres. “Recebemos muitas mensagens delas falando que aprenderam algo para se proteger melhor e até que se identificaram com acontecimentos estranhos em suas vidas”, ressalta Carol.

Qual o problema do true crime?

Assim como muitos temas servem para alertar e conscientizar, denunciar injustiças e preconceitos, mostrar que inocentes podem ser culpabilizados de forma indevida devido às falhas no judiciário, há detalhes que precisam ser considerados. Contudo, o true crime se situa entre o que realmente aconteceu, que não conseguimos acessar completamente porque não estávamos lá, e o que achamos que aconteceu, que podemos teorizar sobre. Muitas são as pessoas que acabam romantizando os crimes e até algumas produções se mostram sensacionalistas ao abordarem os casos e infelizmente,podem ter efeitos devastadores em pessoas inocentes, além de desrespeitarem as vítimas e seus familiares, reforçando estereótipos e preconceitos e fazendo com que o acontecimento seja revivido novamente.

Logo, se faz necessário que seja feito um consumo consciente e ter o discernimento de que por mais que seja baseado em fatos reais, não deixa de ter uma licença poética. É imprescindível se atentar como a história é contada para não se tornar refém de mais uma ficção sensacionalista e ter muita responsabilidade ao dar audiência para quem não merece.

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