“Deus promete vida eterna. Nós cumprimos a promessa.” Não existe uma melhor afirmção do que esta para o livro Os três estigmas de Palmer Eldritch. Um, porque esta chamada está muito bem colocada na questão principal desta trama e porque Philip K. Dick cumpre sua promessa de uma excelente história de ficção.
Sobre o livro
As mudanças climáticas tornaram a vida na Terra insustentável. O planeta está superaquecido e por isso os cidadãos são enviados compulsoriamente às colônias marcianas, condenados a viver em isolamento e sem perspectivas de voltar à sociedade que conheciam.
Na tentativa de sobreviver ao tédio e à situação miserável em que se encontram, boa parte dos colonos passa a depender da Can-D, uma droga alucinógena que permite ao usuário viver temporariamente em uma realidade alternativa. Porém, o surgimento de um concorrente abre uma disputa por esse mercado. Chamada Chew-Z, a nova substância promete cumprir a maior de todas as promessas: vida eterna.
Publicado pela primeira vez em 1965, Os três estigmas de Palmer Eldritch explora um futuro em que a humanidade colonizou outros planetas e trabalhadores usam drogas para suportar a realidade. Traz críticas a sistemas opressivos e ao poder de grandes corporações, além de ser uma das primeiras vezes em que Philip K. Dick apresenta temas religiosas em uma obra.
Relançado sete anos após sua última publicação no Brasil, a nova edição conta com capa ilustrada por Rafael Coutinho, projeto gráfico de Giovanna Cianelli e tradução por Ludimila Hashimoto.
A obra
Como todos os livros de Philip K. Dick, Os três estigmas de Palmer Eldritch é tudo e um pouco mais do que o leitor pode esperar. Com sua narrativa intimista e que mexe com a mente humana, Philip vai um pouco além do esperado ao mexer com contextos de uma droga que muito bem poderia ser comparado com a Internet ou até mesmo o Metaverso que tanto discutimos hoje.
A realidade de colonos que vivem em Marte é apenas a desculpa para uma sociedade que se tornou apenas existencialista, enquanto ela busca dentro de si, mas através de algo lá fora, que neste caso é uma droga, uma forma de fugir de toda esta opressão que é a sociedade e seu modo de ditar regras de convivência e trabalho.
Como tudo que está em suas obras, Philip K. Dick brinca com o imaginário do leitor ao apresentar situações “reais”, quando na verdade tudo era apenas o “imaginário”. É uma maneira interessante de colocar o leitor não apenas como um espectador, mas como um personagem e entender o que está acontecendo.
Assim como os personagens passam por situações onde não sabem diferenciar a realidade da fantasia, o leitor também mergulha nestas situações a entrar na mente de uma pessoa, que também está na de outra e assim por diante. Muitas vezes isto parece o universo do filme A Origem, ou também com de outros livros como Minortity Report.
Além de discutir as questões éticas, profissionais e pessoais, Phlip também tráz para o palco a fé. Com um personagem totalmente ligado a ciência, Palmer começa a questionar todo o seu conhecimento, pois a realidade não é apenas algo palpável, mas também de crenças e a sua verdade.
Os Três Estigmas De Palmer Eldritch, lançado pela Editora Aleph, é uma das melhores obras de Philip K. Dick, pois tudo aquilo que o autor colocou em suas obras, como a crítica social, meio ambiente, o que é realidade, entre outros assuntos, que os leitores puderam conferir em Androides Sonham com Ovelhas Elétricas? (Blade Runner), Realidade Perdida, O Tempo Descunjuntado, entre outros, podem ser vistos como todo o universo construído pelo autor.
Para aqueles que buscam começar por algum dos livros do autor, esta é uma excelente escolha. O único problema que esta versão possui é não ter notas de rodapé para explicar algumas das palavras utilizadas pelo autor, que pode deixar o leitor em dúvida do que aquilo significa, já que nem todos são leitores de ficção científica.