Um ato, uma decisão, um plano podem transformar milhares de vidas, sociedades inteiras, governos e até a história. É o caso dos atentados de 11 de setembro de 2001. O maior ataque terrorista de todos os tempos vitimou quase três mil pessoas e feriu outras nove mil no coração de Nova York. Duas décadas depois, as consequências do atentado ainda têm reflexos nos Estados Unidos e no resto do mundo, como mostra Retratos de uma Guerra Sem Fim, nova série documental original do Globoplay. Em quatro episódios, o repórter Marcos Uchôa mostra os cenários no mundo antes e depois dos atentados, as guerras originadas e suas repercussões, que chegam até o noticiário atual, com a crise no Afeganistão. Para contar essa história, o jornalista passa por países como Paquistão, Iraque, Irã, Síria e Líbano, além dos Estados Unidos. Retratos de uma Guerra Sem Fim estará disponível no Globoplay a partir de sábado, dia 11, inclusive para não assinantes.
Com o olhar de quem viu de perto as consequências de duas décadas de guerra, as quedas de governos e os impactos na economia mundial, o documentário relata como começaram as ameaças do grupo extremista Talibã aos EUA, relembra detalhes do dia do ataque e o início da Primavera Árabe, que culminou em uma série de revoltas populares em mais de 10 países no Oriente Médio. Marcos Uchôa revisita suas viagens aos locais, em especial, à Tunísia, berço das revoluções que se espalharam pelas nações vizinhas. Retratos de uma Guerra Sem Fim também mostra como os moradores de Síria e Líbano, que sofreram com as guerras do passado, se agarram à fé para sonhar com um futuro melhor.
Acostumado a participar das coberturas dos mais variados assuntos, de Jogos Olímpicos e Copas do Mundo e desastres naturais e guerras, Marcos Uchôa viu o mundo se transformar com os próprios olhos em diferentes momentos. Por coincidência, ele estava em Nova York uma semana antes dos atentados, cobrindo a participação do tenista Gustavo Kuerten no US Open, um dos torneios de tênis mais importantes da temporada. “Esse projeto é um passeio por uma parte importante da minha carreira como repórter. Pude ver e aprender muito sobre sociedades, que embora tenham muitas coisas diferentes da nossa, têm também muitas semelhanças. É uma janela aberta de um pouquinho desse mundo dramático dos últimos 20 anos”, diz Uchôa.
Retratos de uma Guerra Sem Fim é mais um documentário original do Globoplay. No catálogo da plataforma já estão títulos como Em Nome de Deus, Caso Evandro, Marielle, o documentário, Cercados, voluntário ****1864 – quem são os anônimos da vacina? e Fênix: o voo de Davi.
ENTREVISTA COM MARCOS UCHÔA
Como surgiu a ideia dessa série documental?
Existia um material inédito da Guerra da Síria, que eu tinha gravado em 2017 com o cinegrafista Sergio Gilz. Com o investimento do Globoplay em séries documentais, achei que poderíamos marcar os 20 anos dos atentados de 11 de setembro e os dez anos da Primavera Árabe. Acrescentamos uma produção na Tunísia para mostrar o único país que tinha conseguido uma transição, complicada mas real, de ditadura para democracia. Apesar das restrições por conta da covid-19, conseguimos fazer essa viagem e descobrimos lá problemas comuns à nossa sociedade, como corrupção na política e na economia, violência policial e desemprego de jovens.
O que mais marcou na produção deste material?
Esse projeto é um passeio por uma parte importante da minha carreira como repórter. A radicalização do mundo pós 11 de setembro gerou conflitos que foram influenciando uns aos outros. Guerras geram muito sofrimento e permitem que um lado humano tóxico prevaleça sobre o lado mais moderado das pessoas. Pude ver e aprender muito sobre sociedades, que embora tenham muitas coisas diferentes da nossa, têm também muito em comum. No fundo, o que todo mundo quer? O convívio com a família, amigos e um trabalho para poder levar a vida. Esse lado, de gente normal desesperada por algo brutal como uma ditadura ou uma guerra, foi o que mais me tocou.
Com os recentes acontecimentos no Afeganistão, como editar um material ainda vivo com fatos acontecendo diariamente?
Os acontecimentos recentes no Afeganistão, atualizamos parte da série. Esse é um tema que sempre se renova. Mas a série é menos uma narrativa de fatos e datas. Eles existem, mas quis passar também uma visão mais geral, mais cultural, uma impressão de cada lugar. Seria impossível condensar em quatro episódios eventos tão dramáticos e complexos. A série serve para informar, mas também para despertar interesse por esse mundo tão globalizado que, embora distante, está muito próximo nas nossas telas. Afinal, discutir a situação das mulheres afegãs pode nos ajudar a refletir sobre como mulheres em geral são tratadas.
Qual a sua memória mais viva desses 20 anos do 11 de setembro?
Memórias de guerras ficam muito vivas na nossa mente. É que uma guerra, por mais cuidado que se tome, e eu sempre tentei ser cauteloso, tem um lado que depende de sorte. Um bombardeio, um atentado, uma emboscada, nunca se sabe. Além disso, como repórter estrangeiro você se destaca na multidão, é fácil notar que você é de fora. A sensação de perigo e de ter que tomar cuidado o tempo todo, a responsabilidade por decisões, tudo isso faz com que teus sentidos estejam aguçados a 100%. As imagens mais alegres foram as dos líbios comemorando o fim da ditadura de mais de 40 anos de Khadafi. As tristes são infelizmente bem mais comuns. E uma em particular dói. Indo embora do Iraque, parei para dar biscoitos e uma garrafa de água para uma menininha na beira da estrada. Muitas crianças pediam qualquer coisa para os raros carros que passavam. A menina, que se chamava Zayra, devia ter uns 8 ou 9 anos, e pediu para eu levá-la. Não era, obviamente, um desejo que eu pudesse realizar. Mas eu sou pai de três filhos e fiquei imaginando o que podia ser a vida daquela criança. Existem sofrimentos que não são visíveis.
O que o púbico pode esperar de Retratos de uma Guerra Sem Fim?
Retratos de uma Guerra Sem Fim, o título da série, é um nome bem adequado. São apenas retratos, momentos pequenos no tempo, na tragédia vivida por vários países. É uma espécie de janela aberta de um pouquinho desse mundo dramático dos últimos 20 anos. E são lugares bem exóticos. Afeganistão, Iraque, Irã, Síria, Arábia Saudita, Paquistão, Tunísia, a produção tem imagens lindas feitas por três cinegrafistas ótimos que trabalharam comigo. É um privilégio ser um repórter brasileiro e ter conhecido e contado essa história. De certa forma, essa série é também um dos retratos do meu trabalho.